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Definindo Estratégias de Aquisições - Abordagem com uso da Matriz de Kraljic


As estratégias de aquisição devem ser particularizadas conforme fatores específicos relacionados ao mercado fornecedor e a sua relevância para a organização compradora. Com base nessa premissa, o Strategic Sourcing (Procura Estratégica) parte da categorização adequada de insumos e serviços, promove a análise dos mesmos com base em metodologias como a Matriz de Compras (Kraljic) para, então, definir as estratégias genéricas de aquisições e seus desdobramentos. Este artigo discorre sobre a Matriz de Kraljic e apresenta as estratégias genéricas oriundas de cada quadrante da matriz.

Processo de Gestão de Aquisições por Categoria

A partir da década de 1980, a função Compras ou Suprimentos tem recebido maior atenção das organizações, após ter sido relegada a um segundo plano pelas empresas ocidentais, devido à ênfase nas funções marketing e finanças. Esta retomada está associada ao surgimento da Gestão da Cadeia de Suprimentos ou Supply Chain Management como disciplina, o que trouxe a visão de um modelo de negócio amplo com intuito de integrar e alinhar organizações para atender o mercado consumidor (o SCOR Model tem os processos básicos Plan/ planejar, Source/ obter, Make/ fazer, Deliver/ entregar, Return/ retornar).

Quase que paralelamente, desenvolvendo-se de forma interligada às pesquisas e à prática em Gestão da Cadeia de Suprimentos, as abordagens estratégicas sugeriam a necessidade das empresas mapearem suas Cadeias de Valor (conceito elaborado por Michael Porter) e se concentrarem em suas competências essenciais (Core Competences) com intuito de ganhar eficiência e flexibilidade. Como decorrência deste movimento, as estruturas antes verticalizadas, ficaram mais enxutas e passaram a ser mais horizontalizadas; com um número expressivo de atividades sendo transferida para uma cadeia de fornecedores.

Por conta de aspectos mencionados anteriormente e pela expressiva representatividade econômica dos custos de aquisição, faz-se necessário uma abordagem estratégica de aquisições e mais refinada por parte da equipe de compras. Neste contexto, uma das melhores práticas na gestão de compras é a gestão por categorias (de compras ou aquisições). Por categoria, entendem-se agrupamentos ou famílias de itens adquiridos ou vendidos, que possuam similaridades através de critérios pré-estabelecidos e seu uso é muito apropriado em organizações com grande quantidade e diversidade de itens.

Através da figura 1, representam-se seis passos de gestão de categorias de aquisições e seu uso para definir processos, rotinas, responsabilidades da equipe de compras, estratégias de aquisições e definição de fornecedores.

A primeira etapa deste diagrama é justamente a da identificação das categorias existentes e sua classificação por gasto (spend), usando a tradicional análise de Pareto, também conhecida como análise ABC.

Figura 1: Processo de gestão de aquisições por categoria

Fonte: Voltolini, E.

Na segunda etapa, faz-se necessário revisar as categorias existentes, trazendo para análise outras variáveis com intuito de fornecer subsídios para a priorização dos esforços e para o encaminhamento que será dado nas etapas seguintes. Neste esforço de priorização deve-se buscar identificar quais categorias tem maior potencial de redução do TCO (Total Cost of Ownership, ou Custo Total de Propriedade), eliminação de riscos e gargalos. É justamente nessa etapa que pode ser aplicada uma ferramenta denominada matriz de Kraljic, que apesar de não ser a única com este objetivo, é tão associada a este esforço de priorização e reflexão que também é conhecida como matriz de compras. Neste texto, objetiva-se discorrer mais sobre a referida ferramenta na próxima sessão.

A etapa 3, visa organizar a equipe de compras e de planejamento de materiais pelas categorias de aquisição (ou compras, como pode ser encontrado em algumas fontes), tais como: serviços logísticos diretos e indiretos, produtivos e não produtivos, matérias-primas, tecnologia de informação, MRO (Manutenção, Reparos e Operações), ou outro tipo de segmentação que faça sentido para a organização. Este tipo de divisão tende a enfatizar a similaridade do processo de gestão da categoria e características técnicas sobre a categoria e seu mercado fornecedor, gerando maior especialização do responsável e efetividade de suas ações.

A quarta etapa trata da elaboração das estratégias de aquisições e abordagens a serem seguidas conforme cada categoria definida. Em termos estratégicos, esta etapa conecta a função Compras com a estratégia corporativa previamente definida; utilizando-se de ferramentas como análise de SWOT, as 5 Forças de Porter, Análise PESTEL e outras para realizar o planejamento estratégico de aquisições.

A etapa seguinte busca identificar e selecionar os fornecedores conforme as abordagens e estratégias definidas. A abordagem categorizada e o uso de ferramentas como a Matriz de Kraljic na etapa dois, permitirão empregar mais tempo e recursos na seleção de fornecedores de categorias mais críticas e estratégicas. A adoção de ferramentas como as RFX´s (Request for Proposal, Request for Information, Request for Quotation, Request for Qualification) certamente não serão empregadas em categorias com ampla disponibilidade de fornecedores, para itens de pouca relevância para o negócio.

A última etapa do processo trata do dia-a-dia do relacionamento e desenvolvimento dos fornecedores. Trata-se da definição e execução do plano tático por categoria, visando atingir as metas pré-estabelecidas. Para tanto, são realizadas reuniões com fornecedores - caso a abordagem justifique - e planos de ação são estabelecidos e monitorados.

Na próxima seção será descrita a Matriz de Kraljic, mencionada anteriormente e realizada na etapa dois do processo; porém com desdobramentos nas fases seguintes.

Matriz de Compras (Kraljic)

Em 1983, o acadêmico e consultor Peter Kraljic publicou na tradicional revista Harvard Business Review um artigo no qual propunha uma forma estruturada de análise e tomada de decisão com intuito de implementar diferentes estratégias de fornecimento para com seus fornecedores. Este método de análise partia do impacto que o mesmo traz para o negócio (fatores internos) versus a avaliação da complexidade de obtenção de determinado produto, bem de consumo ou serviço no mercado (fatores externos)

Os fatores internos estão agrupados sob a alcunha “Impacto no Negócio” na figura 2, podendo também ser denominada como “Impacto Financeiro no Negócio”, “Gastos Relativos”, dentre outros. O Impacto no Negócio procura representar a importância estratégica que os materiais e serviços comprados representariam para a organização, sob a forma dos seguintes pontos:

  • Custo do produto como % do valor total de aquisições;

  • Influência da mudança de preço no resultado final da empresa;

  • Volume de compras;

  • Flexibilidade de preço do produto.

Os chamados fatores externos estão ligados à complexidade dos mercados fornecedores dos respectivos insumos ou serviços, por isso denominados de “Risco no Fornecimento” (ver figura 2), ou “Risco/ Dificuldade de Fornecimento”, “Complexidade de Suprimento”. Para orientar o processo de ponderação pela equipe envolvida na análise, são sugeridos os pontos abaixo:

  • Número de fornecedores;

  • Escassez de capacidade de fornecimento;

  • Padrão (Standard) x Específico;

  • Complexidade da especificação;

  • Complexidade do processo;

  • Requisitos ambientais, tecnológico, qualidade;

  • Volatilidade tecnológica e grau de inovação.

Figura 2: Matriz de Compras

Fonte: Adaptado de Kraljic

Ao considerar de forma combinada os fatores que integram os constructos “Impacto no Negócio” e “Risco no Fornecimento” traz-se um novo olhar sobre os mercados fornecedores, que deve dar origem as diferentes abordagens em relação aos mesmos.

O eixo vertical da matriz (figura 2), “Impacto no Negócio”, deve ser dividido em dois níveis. Na parte superior, encontra-se uma concentração dos itens de maior peso financeiro para empresa, são os itens A e B da curva ABC, que possuem maior importância estratégica (dependência para o negócio).

Na parte inferior do eixo vertical, contudo, têm-se os itens de menor impacto financeiro. São os itens C e D da análise de Pareto (ou Curva ABC) e os indiretos, caracterizando-se por uma grande quantidade de SKU´s (stock keeping units) com pouca relevância financeira para a empresa.

Considerando o eixo horizontal do gráfico, “Risco no Fornecimento”, temos duas visões distintas para formar as colunas de nossa matriz. À direita do eixo estão os itens inseridos em um mercado mais complexo, com poucos fornecedores, preços indexados, com grande dificuldade para novos entrantes, parâmetros técnicos elevados, dentre outros complicadores para o comprador. Posicionados na coluna à esquerda, estão os produtos ou serviços que estão em um mercado mais competitivo, com muitos fornecedores, baixa diferenciação e brigas por contratos de fornecimento; tornando a oferta ao comprador mais facilitada e previsível.

A partir do mapeamento dos itens comprados ou serviços contratados, é possível traçar diferentes estratégias de relacionamento, que estão posicionadas segundo os quadrantes na figura 1. As principais estratégias podem ser definidas como: crítico ou gargalo; não crítico; alavancável e estratégico.

Crítico ou Gargalo

Este quadrante é formado pela intersecção de baixo “Impacto no Negócio” e alto “Risco no Fornecimento”. Neste caso, o grau de dependência da organização com relação aos fornecedores tende a ser alto, o número de fornecedores no mercado pequeno ou, ainda, as características técnicas do fornecimento são complexas. Em suma, existe grande dificuldade em desenvolver novas fontes de fornecimento que atendam os requisitos estabelecidos.

Não Crítico

Composto por itens de baixa complexidade do fornecimento e de baixa representatividade econômica e financeira para a empresa. Estes itens tendem a possuir grande oferta de fornecedores e relativa simplicidade na substituição destes. Por outro lado, normalmente refere-se aos itens que demandam muita atividade operacional da gestão de compras, dada a dispersão de itens.

Alavancável

Este quadrante é destinado aos itens com baixa complexidade do fornecimento e alta importância interna da compra. Os impactos econômicos nas negociações com fornecedores destes itens são significativos para a organização e, ao mesmo tempo, o risco associado ao fornecimento seria baixo.

Estratégico

O quadrante Estratégico é formado pela combinação de alta complexidade no mercado fornecedor e alta importância interna do fornecimento. Desta forma, o impacto nos resultados e na geração de valor das organizações através da gestão da compra destes itens é significativa e os mercados fornecedores são complexos e com riscos significativos no fornecimento.

Estratégias Genéricas de Aquisição

Partindo das características de cada quadrante da Matriz de Kraljic, sugere-se a adoção de estratégias genéricas. Cabe ressaltar, que a compreensão destas estratégias e seu posterior desdobramento são os objetivos finais da análise propiciada pela Matriz no âmbito de cada categoria.

A própria abordagem diferenciada para cada conjunção de fatores está alinhada com o princípio do Risco Seletivo (ver post Princípios da Logística Virtual), que recomenda uma análise dos riscos de forma ampla e particularizada na cadeia logística. A Matriz de Compras aborda os riscos internos e do mercado fornecedor, usando esta compreensão para recomendar abordagens estratégicas e táticas direcionadas. Partindo da síntese da figura 2, são elencadas as abordagens estratégicas por quadrante.

Figura 3: Direcional estratégico da Matriz de Compras

Fonte: o autor

No quadrante “Crítico”, a estratégia de fornecimento mais relevante é a redução de riscos de fornecimento dos respectivos itens. Esta estratégia se desdobra em três principais abordagens, sendo que a primeira busca garantir fornecimento pelas fontes atuais através de contratos de longo prazo. As outras duas abordagens tratam de reduzir a dependência dos mercados fornecedores através do desenvolver fornecedores alternativos, pelos responsáveis de compras, ou ainda através de mudanças nas especificações técnicas dos insumos ou serviços.

Dada a grande quantidade de itens presentes no quadrante “Não Crítico”, gera-se uma demanda de trabalho, que pode desviar a energia da equipe de compras de outras atividades de maior valor agregado. A estratégia primária, portanto, é o aumento da produtividade das atividades operacionais da gestão de compras. Isto pode ser obtido através de contratos guarda-chuva com fornecedores, isto é, contratos compreendendo grande número de itens facilitando a operacionalização da compra. Também cabe a adoção de abordagens automatizadas para prover a simplificação das transações e o reabastecimento sem envolvimento do time de compras para sua execução.

Os itens alavancáveis são aqueles com a maior diversidade de abordagens empregadas com intuito de viabilizar a estratégia de maximização de ganhos. Esta estratégia se concentra em dois pontos para alcançar seu objetivo: promover a competição entre os fornecedores e estimular a adoção de itens substitutos. Sendo assim as abordagens podem ser a de redução de preço por volume comprado, a substituição de fontes de fornecimento, emprego de leilões, uso das RFX´s em processos de cotação, renegociação das tabelas de preços entre outros.

Para os itens estratégicos, deve-se compreender que a proximidade com o fornecedor é essencial para a construção de parcerias ou mesmo de alianças estratégicas. Para estes itens, cujo pêndulo do poder está do lado do fornecedor, e que são críticos para os processos de produção, ou para o desempenho econômico-financeiro; a geração da vantagem competitiva compartilhada é a estratégia. Os caminhos para isso são o investimento conjunto e a estruturação de parcerias de longo prazo, com estímulo à criação de uma relação aberta e de confiança.

A implantação destas estratégias é complexa e exige grande esforço coordenado para o quê, sugere-se adoção de metodologia de gestão de projetos. O número de itens analisados pode facilmente extrapolar várias centenas, portanto a adoção de categorias como nível de análise é recomendável sempre que possível. Mesmo assim, cada categoria é um caso diferente, cada organização tem seu próprio contexto e precisa de um planejamento de aquisições próprio e atualizado.

Considerando o esforço envolvido a o risco advindo das mudanças na base de fornecedores e na forma de conduzir os processos de aquisição de bens e serviços, é fundamental aportar conhecimento, comprometer os envolvidos (stakeholders), testar e validar estratégias e abordagens, com intuito de promover a continuidade e o êxito da Gestão Estratégica de Compras.

Considerações Finais

O planejamento estratégico de compras/aquisições tem recebido mais adesão das empresas, conforme fica claro o impacto na redução dos gastos e a dimensão tático/estratégica da função Compras. A abordagem por categorias é essencial tanto para o planejamento, quanto para a gestão da execução e se somará às ferramentas apresentadas para compor o Strategic Sourcing.

Os passos, análises e decisões mencionadas neste texto não devem ser entendidos como algo estático e sim como um processo a ser repetido a cada um ou dois anos, pois impacta na revisão das carteiras dos compradores e analistas de planejamento de materiais, na definição de metas e dos projetos da organização.

É necessário também ter acompanhamento dos contratos de fornecimento e gestão do desempenho dos fornecedores e das iniciativas, além de buscar constantemente atualizações de novas tecnologias, conceitos e recursos para a área de compras. Se precisar de ajuda nesta jornada conte com a EXCENT Consultoria.

Referências

KLIPPERL, Marcelo; ANTUNES JUNIOR, José Antonio Valle; VACCARO, Guilherme Luís Roehe. Matriz de posicionamento estratégico de materiais: conceito, método e estudo de caso. Gestão da Produção, [S.I], v. 14, n. 1, p. 181-192, jan-abr. 2007.

KRALJIC, Petter. Purchasing Must Become Supply Management. Harvard Business Review, [S.I], set-out, 1983.

MONCZKA, Robert M.; HANDFIEL, Robert B.; GIUNIPERO, Larry C.; PATTERSON, James L. Purchasing & Supply chain management. 6ª. ed. South-Western: College/West, 2015.

ASSEN, Marce van; BERG, Gerben van den; PIETERSMA, Paul . Modelos de Gestão: 60 modelos que todo gestor deve conhecer. 2ª.ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall. 2010.

VOLTOLINI, Elton. Princípios da Logística Virtual Disponível em: <https://www.excentconsultoria.com.br/conhecimento> Acesso em: 24 de novembro de 2017

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